Tornar-se inteiro: notas sobre Tipos e Individuação em Jung
O Nascimento da Personalidade
Janeiro, 2021
“Personalidade é Tao.” C. G. Jung
Prezados,
O advento do nascimento da personalidade, de pessoas que possuem uma visão da vida potencialmente enobrecedora e transcendente, é o nexo cintilante de uma longa e dura jornada. O surpreendente fato sobre essa batalha evolutiva é que tropeçamos para cima, em um movimento ascendente na direção de modos mais elaborados de consciência até o repentino nascimento da personalidade.
A Matéria Imbuída de Vida
Por meios misteriosos, a matéria imbuída de vida com capacidade reprodutiva permitiu que a consciência evoluísse, crescesse em refinamento e complexidade até a chegada da personalidade como a coroa que acompanha a consciência. A longa e paciente peregrinação de mais de quinhentos milhões de anos, desde as primeiras formas de consciências unicelulares incapazes de aprendizado até as complexas formas atuais autodirigidas é uma história milagrosa de evolução. De amebas e trilobitas ao cérebro dos mamíferos, as formas orgânicas se tornaram progressivamente mais receptivas e complexas.
A consciência parece ter emergido por uma certa escada ascendente invisível. Cada uma das oito formas de consciência humana descritas por Jung podem ser consideradas degraus nesta escada até que os degraus finais possibilitaram o nascimento da personalidade.
A Percepção
Podemos imaginar que uma das primeiras orientações da consciência a se instalar, muitas centenas de milhões de anos atrás, seria a percepção que dá sentido ao mundo exterior – a habilidade para rapidamente apreender o mundo que está lá fora. Esta forma de consciência varia de espécie para espécie, mas em cada caso, é um tipo de reconhecimento dos objetos externos. À medida que evoluiu como consciência humana, passamos a nomear esta percepção como sensação extrovertida – a percepção detalhada e precisa dos objetos no mundo.
A habilidade de realizar julgamentos e tomar decisões provavelmente se instalou cedo como companheira da percepção – o processo de pensamento que cria um sentido ordenado do que ocorre no mundo. Quando evolui e aparece na forma humana, referimos a ela como pensamento extrovertido, orientado a aplicar lógica aos objetos e eventos no mundo externo.
A Coragem
Coragem como forma de escolha consciência se tornou disponível em algum momento da escalada evolutiva – a habilidade de se manter firme em face do perigo, proteger sua prole, conscientemente escolher lutar, persistir ou proteger. Graduando-se em forma humana, tornou-se uma orientação consonante com sua raiz etimológica cor-, radical de coração. Evoluiu como a nobre e idealista aspiração que identificamos como o sentimento introvertido. Tornou-se a orientação na experiência humana que constrói o caráter, considera as questões de como as coisas devem ser, forma ideais e se submete aos valores profundamente sentidos por nós.
Também na ascensão evolutiva, uma consciência que impeliu as descobertas emergiu como um ímpeto para aprender mais e expandir o próprio campo da consciência. Desenvolvida em forma humana, nós a conhecemos como pensamento introvertido, eternamente buscando entender e derivar significados das coisas para formar uma compreensão holística.
Então, em vários graus, a cooperação surgiu como um empreendimento da consciência e um desejo para coordenar e se relacionar, uma ânsia social para encontrar harmonia com os outros. Conhecemos este anseio como o sentimento extrovertido, senhor da empatia direcionada às necessidades e valores dos outros.
Cinco Formas de Consciência
Encontramos estas cinco formas de consciência em mamíferos mais desenvolvidos, com quem frequentemente compartilhamos o sentimento de companheirismo. Alguns modos de percepção destes mamíferos podem ser mesmo maiores que os nossos próprios. A percepção de som, sabor, toque ou visão, por exemplo, são significativamente melhores em outras espécies. Mas com estes mamíferos que exibem algum grau destes cincos modos de consciência, temos afinidade que nos permite estabelecer algum tipo de relação.
O próximo modo de consciência significativo é provavelmente ausente em outros mamíferos ou, ao menos, temos menos evidências deles. É a orientação intuitiva que apreende uma outra realidade, a realidade que parece “mais real que o real”. A intuição inclui o desejo e a habilidade de se relacionar com um plano além da dimensão material, uma realidade que profetas e místicos insistem que precisamos reconhecer. A intuição, “o dom mais nobre do homem”, como é descrita, se refere a uma orientação holística fundamentada na imaginação e na experiência da vida interior, referindo-se a um modo de consciência que aqui nomeamos como intuição introvertida.~
A Intuição Introvertida
A intuição introvertida atrai as outras orientações introvertidas, seja pensamento ou sentimento, para as imagens que ela apreende, auxiliando-os a se desenvolver e atribuir significados e valores mais profundos que podem direcionar o percursos individual e da civilização. Conceitos abstratos como Verdade, Beleza e Bondade podem ser considerados e avaliados como conteúdos altamente imaginativos e conceituais desta forma de consciência.
Duas outras orientações intuitivas sinópticas permitem à consciência que tenha visões temporais do passado e do futuro. Engajam-se na vida como uma consciência de um milhão de anos de idade que pode acessar a história e profeticamente antecipar o futuro. Estas formas de consciência são ambas orientadas ao mundo interno e ao mundo externo simultaneamente: sensação introvertida e intuição extrovertida. Combinando-se com as outras seis, elas possibilitam uma sabedoria para compreender holisticamente o passado e forjar criativamente um novo futuro.
Os Oito Modos de Experiência
Com estas oito orientações de nossa experiência consciente, o requisito fundador para a personalidade é inaugurado. A personalidade em si possui uma consciência que eclipsa o percurso evolutivo destas oito formas. Pessoas percebem sua experiência consciente e mais que isso, elas percebem que percebem. A personalidade unifica a experiência de vida ao longo do tempo, completamente consciente de que o Eu que experimentou a vida como uma identidade de oito anos de idade é também o Eu que está experimentando a vida aos oitenta anos.
A personalidade une e unifica os oito modos de experiência consciente. Para que uma personalidade única se expresse, todas as oito orientações evolutivas são indispensáveis. A completa expressão de um indivíduo único é o que Jung chama de individuação. De todos os propósitos e esforços de que nos ocupamos, a individuação – a expressão unificada da personalidade única – é o mais importante, enriquecendo-nos individualmente e enriquecendo o próprio tecido da civilização neste processo, neste mundo e para além dele.
James G. Johnston
Autor de Jung’s Indispensable Compass: Navigating the Dynamics of Psychological Types