Nestas duas últimas semanas de agosto o contato com a morte foi um acontecimento.
Dois casos ligados a pessoas mais velhas e com sofrimento intenso e um a um bebê de quatro meses, igualmente muito doente. O que todos eles tiveram em comum? A compreensão de seus familiares de que todos irão um dia e que nada é ao acaso. A clareza de que a vida é mais do que o momento presente. A serenidade diante dos fatos. A esperança do reencontro.
Diante destes acontecimentos este artigo tem como proposta refletir um pouco sobre um tema que é evitado a todo o momento e só encarado quando o fato acontece.
A perspectiva da morte concentra de alguma forma a atenção da mente. Essa perspectiva faz com que a ideia da morte e o medo que ela inspira persigam o Homem como nenhuma outra coisa. O desejo é evitar e vencê-la, negando aquilo a que todos estão destinados.
Ao mesmo tempo em que o temor da morte está sempre presente no funcionamento psicológico do nosso instinto de autopreservação, também é total o nosso esquecimento desse temor em nossa vida consciente, mas afinal, qual o ganho ao compreendê-la?
No ensaio “Alma e Morte”, Jung escreve que é no misterioso momento do meio dia da vida que acontece o nascimento da morte, ou seja, mais ou menos entre os 35 e 45 anos, quando a curva da vida alcança o seu auge , dá-se a grande transição.
No entanto, o que se observa é que no ocidente, hoje mais do que qualquer outro período da história, a morte está sendo ignorada, travestida de sono à base de maquiagem e formol. A preparação durante a vida é para envelhecer e não morrer.
As declarações de Jung sobre a morte baseiam-se numa concepção de crença na vida, que ele nunca formulou de modo tão incisivo. Ele via a vida como um setor do Ser que transcende infinitamente os anos vividos. Chamava o fim da vida de “um segundo nascimento […] que, de fora, se parece com uma morte”, e que “a assim chamada vida” é apenas “um breve episódio entre dois grandes mistérios que, de fato, se resumem em apenas um”. (1995,p.15)
Para Jung, uma preparação bem compreendida para a morte, é o processo de individuação, onde cada pessoa tem de trilhar um caminho de destino próprio, uma individuação pessoal, para a realização do sentido da vida.
Vida é morte, morte é vida. A importância de não ignorarmos esta abordagem pode residir na qualidade do que poderíamos ganhar acreditando mais no amanhã, dando oportunidade na realização de ações realmente importantes para o bem comum, focar no que é realmente importante e relevante, pois nossa consciência sobre a finitude colaboraria para sermos seres humanos melhores, colaborando, inclusive com as nossas relações interpessoais.
Compreendendo que a vida é passageira, aproveitar cada minuto consciente de nossos ganhos e perdas de forma a conquistarmos uma vida que realmente vale a pena ser vivida, jogando fora situações que não valem a pena repetir.
Sobre isto Heidegger (2007) diz que a morte se repete em cada situação de escolha. Assumir a morte como possibilidade presente a cada instante é o mais responsável passo na busca de uma existência autêntica e criativa.
E como disse o poeta:
O tempo só anda de ida.
A gente nasce, cresce, amadurece, envelhece e morre.
Pra não morrer tem que amarrar o tempo no poste.
Eis a ciência da poesia.
Amarrar o tempo no poste.
Manoel de Barros
Referências
ANGERAMI, Valdemar Augusto – Psicoterapia Existencial. 4ª ed. – São Paulo: Thomson Learning Brasil, 2007.
JAFFÉ, Aniela et all – A Morte a luz da psicologia. 10ª ed. – São Paulo: Cultrix, 1995.
Muito bem colocado o texto Patrícia, sofremos muito com a morte, porém ela é natural assim como a vida.
O ser humano nem quer conversar sobre a morte, sempre achando que é um assunto pra depois,
se analisarmos do ponto de vista que vc escreveu é muito mais fácil de entender.
Gratidão,
Elsa